Quando o tiro sai pela culatra: o efeito backfire

Imagem da capa: (LOLLOJ/SHUTTERSTOCK)

Vivemos em um tempo de euforia nos debates ideológicos, onde ocorre uma forte polarização. Ao utilizar a razão para discutir, nos esquecemos que estamos suscetíveis à vieses cognitivos que atrapalham o entendimento do ponto de vista alheio e também faz com que o outro não nos entenda. Imagine o seguinte cenário: você está diante de um cético da evolução. Logo você apresenta diversas evidências como registro fóssil, espécimes intermediários, animais em processo de especiação e até mesmo explica os mecanismos da seleção natural e a organização dos organismos na árvore da vida. Aliviado, você pensa que explicou muito bem e o indivíduo irá te entender. Mas, surpreendentemente, não apenas o indivíduo não acredita em nada do que você disse como passa a acreditar com mais força que a evolução não existe! Esse é um claro exemplo do efeito backfire, apenas um dentre muitos fenômenos cognitivos que afetam o uso da razão.

O efeito backfire diz que as pessoas, diante de evidências contrárias às crenças preestabelecidas, tendem a não reconsiderar sua opinião e acreditar mais fortemente na mesma. Isso acontece porque as pessoas não querem ser vistas como “idiotas” na frente dos demais, já que uma mudança de opinião é muitas vezes interpretada como fraqueza ou falta de personalidade. Além disso, as opiniões normalmente estão vinculadas a valores profundos, fazendo com que a reconsideração de um ponto de vista afete todo um conjunto de crenças: se alguém mudar de ideia sobre o aborto – para qualquer um dos lados -, provavelmente terá que repensar as crenças sobre ética, vida, direitos femininos e liberdade sexual. Logo, é difícil deixar uma opinião pois muitas outras a sustentam e reconsiderá-las é trabalhoso e podem levar o indivíduo a se achar incapaz de raciocinar.

Para reduzir tal efeito, é possível propor reflexões menos contundentes sobre um determinado tema. Assim, o outro indivíduo pode sentir-se menos ameaçado e o debate flui melhor. Geoffrey L. Cohen e David K. Sherman publicaram um estudo em 2002 que se auto afirmar e manter uma melhor autoimagem reduz a presença de vieses cognitivos de defesa.

Portanto, para que um debate seja saudável, é necessário reconhecer que você mesmo é suscetível à vieses e então deve saber que mudar opiniões é natural e não afeta sua integridade intelectual. Além disso, evitar argumentos muito contundentes ajuda o outro indivíduo a não apresentar os mesmos vieses.

 

Referências:

Como convencer alguém quando os fatos falham, traduzido de Scientific American: https://muralcientifico.com/2017/02/26/como-convencer-alguem-quando-os-fatos-falham/

Want to Win a Political Debate? Try Making a Weaker Argument: https://psmag.com/news/why-even-your-best-arguments-never-work-64910

 

Accepting Threatening Information: Self–Affirmation and the Reduction of Defensive Biases: http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1111/1467-8721.00182

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