Como funciona a maconha e o que ela faz com seu corpo

A maconha, ou marijuana, é a droga psicoativa ilícita mais consumida do mundo. Segundo estimativas da OMS, há de 180 milhões de usuários globalmente. O gênero Cannabis inclui três diferentes variedades: C. sativa, C. indica e C. ruderalis, sendo a primeira destas a espécie mais conhecida popularmente. Apesar de suas potenciais propriedades medicinais, que vêm sido cada vez mais elucidadas ao longo dos anos, ela é utilizada majoritariamente com propósitos recreativos. 

Os canabinoides são substâncias de origem animal, vegetal ou sintética capazes de se ligar aos receptores canabinoides. O conjunto de receptores canabinoides, de  endocanabinoides – que são produzidos pelo próprio organismo – e de enzimas envolvidas em seu metabolismo constituem o sistema endocanabinoide.

Existem dois receptores canabinoides conhecidos – CB1 e CB2, numerados a partir da ordem de descoberta. Os receptores CB1 são localizados principalmente no sistema nervoso central – embora também sejam encontrados no sistema nervoso periférico e em diversos órgãos e tecidos, incluindo o tecido adiposo. Eles estão envolvidos com a regulação de processos homeostáticos, que mantêm a ordem e o funcionamento correto do organismo. O receptores CB2 estão presentes nas membranas plasmáticas das células do sistema imunológico, exercendo importante papel na resposta imune.

Os principais canabinoides endógenos são a anandamida e o 2-AG. Estão envolvidos com regulação imune, inflamatória e hormonal e com o controle do apetite, do sono, da memória e dos movimentos. Também possuem relação com a diminuição da resposta de dor e com a proteção do sistema nervoso.

No que diz respeito aos fitocanabinoides – aqueles obtidos de espécies vegetais – os mais conhecidos são o tetra-hidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), embora sejam conhecidos dezenas de canabinoides presentes na espécie C. sativa. Dentre os dois, apenas o THC possui propriedades psicoativas – ou seja, que alteram faculdades psíquicas, mentais e/ou comportamentais. A concentração de tais substâncias varia de acordo com diversos fatores: espécie, modo de cultivo, local de cultivo, parte da planta utilizada, dentre outros. Os efeitos do uso da maconha sobre o organismo são variáveis, tendo relação principalmente com a proporção entre o THC e o CBD encontrados na planta.

 

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Estrutura química da anandamida – canabinoide endógeno – e do THC – fitocanabinoide com propriedades psicoativas.

 

EFEITOS FISIOLÓGICOS E PSICOLÓGICOS DOS CANABINOIDES E SUAS POTENCIAIS PROPRIEDADES TERAPÊUTICAS

O THC e o CBD possuem efeitos diferentes sobre o sistema endocanabinoide. Enquanto o THC possui uma alta afinidade pelos receptores CB1, sendo responsável pela maioria dos efeitos psicoativos da Cannabis, o segundo não exerce efeitos significativos sobre tais receptores. 

A marijuana possui uma bem estabelecida ação antiemética, antinociceptiva e orexígena – ou seja, capacidade de prevenir náuseas e vômitos, de aliviar dores e de aumentar o apetite. Por tais motivos, tem sido empregada como forma de aliviar os sintomas desagradáveis relacionados a tratamentos quimioterápicos. Estudos incipientes também têm encontrado correlação entre o uso do CBD e a redução no avanço do câncer, possivelmente devido a uma ação antioxidante e anti-inflamatória da substância. 

De acordo com diversas pesquisas recentes, o CBD possui uma ampla gama de possibilidades terapêuticas. Uma das mais importantes é sua potencial ação neuroprotetora, auxiliando no tratamento de doenças neurodegenerativas como mal de Alzheimer, mal de Parkinson e esclerose múltipla, além de reduzir danos neurológicos causados por derrames cerebrais, abuso de álcool e hipóxia – baixa oxigenação.

Existem evidências de que o uso do THC pode aumentar o risco de episódios psicóticos e do desenvolvimento de psicose crônica em indivíduos susceptíveis. No entanto, estudos sugerem que o CBD pode mitigar esses efeitos, de forma que o uso de uma planta com maior relação CBD/THC possui menos riscos em potencial. Pesquisas com modelos animais também têm encontrado resultados positivos no que diz respeito ao tratamento do estresse crônico, ansiedade e estresse pós-traumático. 

É de grande importância salientar que, em geral, os estudos previamente referidos foram realizados com as substâncias puras e em ambientes controlados. A Cannabis em si possui diversos outros compostos com efeitos ainda não elucidados. Sua ação também é variável de acordo com o indivíduo, com a via de administração e com fatores ambientais. Além disso, a comercialização não regulada da droga impede o controle de sua composição e método de preparo, o que pode apresentar riscos imprevisíveis ao usuário. 

 

REFERÊNCIAS

Francischetti E.A., Abreu V.G.; O sistema endocanabinoide: nova perspectiva no controle de fatores de risco cardiometabólico. Arq. Bras. Cardiol. vol.87 nº4 São Paulo Oct. 2006.

Cavalcanti, E.F.S., Filho, S.R., Ribeiro, M.L.B. Exposição de motivos da resolução CFM Nº 2113/2014. <http://portal.cfm.org.br/canabidiol/motivos.php&gt; Acesso em 25 fev. 2018.

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